08 dezembro, 2006

VIOLÊNCIA URBANA E RURAL: A questão agrária no Brasil

Trabalho apresentado no “I Seminário Internacional Direitos Humanos, Violência e Pobreza – A situação de crianças e adolescentes na América Latina hoje - UERJ - 25, 26 e 27 de outubro de 2006” – GT I: Direitos Humanos e Criminalização da questão social na América Latina. Questão Social e Cidadania na América Latina, em 26/10/2006. Publicado nos Anais: ISBN 85-88769-11-5.

Elias Canuto Brandão
Historiador, mestre em Educação e doutor em Sociologia; professor colaborador na Faculdade Estadual de Educação, Ciências e Letras de Paranavaí (2005-2007); conselheiro nacional do Movimento Nacional de Direitos Humanos/Brasil (MNDH) e coordenador do MNDH no Paraná (2004-2008). Blogs: http://porta-da-cidadania.blogspot.com e http://elias-brandao.blogspot.com; E-mails: brandao@teracom.com.br ou canutobrandao@hotmail.com


Apresentação
Discuto no presente artigo a violência urbana e rural no Brasil, conseqüência da organização social e política desde a invasão portuguesa em 1500. Trabalho com a questão da territorialidade, tendo como tema principal a terra e o antagonismo: riqueza X pobreza; latifúndios X pequenos agricultores, estratégias de governo X políticas públicas.
A terra usada para produção-exportação implica na exclusão e pobreza, na migração por trabalho nas cidades e campos, na condição de diaristas, bóias-frias ou mensalistas.
Em contraposição, as políticas econômicas adotadas favorecem a acumulação e a concentração de terras, industrias, comércio e bancos que influenciam nas políticas setoriais do país. Acrescentemos ao disparato o desmatamento, as queimadas e os assoreamentos dos rios.
As conseqüências das diferenças sociais e da acumulação de bens e capitais é a destruição da natureza: seca, desaparecimento de minas e rios, alteração do meio ambiente, êxodo rural, inchaço nas cidades, desemprego, marginalização, organização de favelas e ocupações desordenadas dos espaços urbanos por meio de moradias debaixo de pontes, morros e mananciais e a perda da dignidade humana.
O inchaço das cidades favorece a organização do tráfico de drogas, o crime social e político, a violência urbana, a superpopulação carcerária e a corrupção nos diferentes setores da sociedade, permeando o executivo, o legislativo e o judiciário, o que poderia ser equacionado com políticas públicas de Reforma Agrária de retorno do homem ao campo.

A questão agrária

A questão agrária no Brasil iniciou errada desde a colonização/invasão, em 1500, século XVI. As políticas adotadas, no período, pela Coroa portuguesa para o Brasil têm as mesmas características metodológicas das políticas agrárias e agrícolas implementadas pelo governo brasileiro do início do século XXI. São políticas que favorecem acumulação e a concentração.
Para os grandes latifúndios há sempre favorecimentos, projetos e programas de longo prazo viabilizando quitações de empréstimos ou mesmo perdão de dívidas, juros e correções monetárias.
O contrário ocorre com os pequenos proprietários, minifúndios e assentados. Os projetos são de curto prazo e não se constata perdões de dívidas, juros e correções.
A questão agrária – terra – é sinônimo de enriquecimento e acumulação. Quem a tem, tem vez, tem poder, tem voz, define as políticas, determina os governantes e interfere nas esferas dos poderes: executivo, legislativo e judiciário.
Tratando-se da terra, algumas situações devem preocupar os cidadãos: o desmatamento, as queimadas e os assoreamentos dos rios, que resultam nas constantes secas e no desaparecimento das minas e rios, o que, em breve, prejudicará todos os animais e o meio ambiente.
A estrutura organizacional política no Brasil, desde a colonização, têm favorecido o êxodo rural, o inchaço das cidades, o desemprego, a marginalização, a organização de favelas, as ocupações e moradias desordenadas em morros, mananciais e debaixo de pontes. A organização estrutural favorece a organização do tráfico de drogas, o crime social e político, a superpopulação carcerária e a corrupção generalizada nas diferentes classes sociais: ricas e pobres, nos setores privados e públicos, na economia e na política.
As desigualdades sociais e políticas, geram violências, guerra de quadrilhas especializadas, permeando os diferentes escalões dos setores públicos, inerentes na história política dos países.
Os criminosos do século XXI, encontram-se estabelecidos em todos os setores públicos e privados, podendo ser empresários e políticos camuflados de honestos e éticos.
As situações vivenciadas na contemporaneidade são resultados da organização social e política do Brasil colônia, conseqüências da forma como a distribuição das terras foi implementada pela Coroa portuguesa favorecendo a concentração, acumulação e especulação de terras, enriquecendo poucas famílias.
Marcou o período a distribuição/concessões pela Coroa portuguesa a integrantes da nobreza portuguesa ou aos prestadores de serviço à Coroa, de grandes extensões de terras – chamadas capitanias hereditárias. Os favorecidos das capitanias tinham o direito de a explorá-la, protegê-la e conceder a terra a herdeiros. Tal política durou do período colonial ao início do império.
As capitanias foram o início do surgimento dos latifúndios escravistas que se sustentavam nas produções de açúcar voltadas para exportação e eram estruturados nas grandes propriedades que viviam do tráfico negreiro.
No período da colonização, a apropriação da terra se deu por meio da expropriação do que existia: pau-brasil, ouro, prata, índios, imigrantes europeus, negros...
A estrutura escravista começou a ser abalada na metade do século XIX, pela Lei de Terras de nº 601, de 18/09/1850, que estabelecia proprietário de terra somente aquele que a comprasse em dinheiro da Coroa, marginalizando os pobres, vez que somente aqueles que tivessem recursos financeiros poderiam ser proprietários. Aos pobres (colonos, imigrantes e índios) coube trabalhar para os latifundiários, resultando no endividamento dos pobres nas fazendas visto terem que comprar produtos para alimentação, vestuário ou doenças nos armazéns existentes nas fazendas e pertencentes aos latifundiários. Ou seja, o que ganhavam ficava na fazenda como pagamento de dívidas.
Destacamos que a Lei de Terras contribuiu com o monopólio e concentração da terra, dificultando o acesso dos pobres a ela que passaram a fazer parte de um mercado de substituição à mão-de-obra escrava.
A substituição da mão-de-obra escrava resultou na busca de imigrantes europeus que foram utilizados para preencher a ausência interna de mão-de-obra da cana-de-açúcar (Nordeste) e plantio de café (Sudeste). Diante do exposto, podemos pontuar:
· 1534: início da repartição das 15 capitanias doadas a 12 donatários;
Ø Mais tarde, das capitanias, criou-se as sesmarias – extensões de terras menores que as capitanias que também eram grandes extensões de terras e eram sempre doadas aos amigos do rei;
Ø No mesmo ano iniciou o tráfico negreiro da África.
· 1822: Independência do Brasil;
Ø As terras até 1850 eram adquiridas por doação e ou posse por parte dos colonos;
· 1850: Decretada a Lei de Terra nº 601, que estabelece a compra da terra;
Ø Prejudicados com a Lei de Terra: colonos pobres, negros e índios;
Ø Beneficiados com a Lei de Terra: pessoas abastadas e latifundiárias;
· Economia do País do século XIX: agrário-exportadora de base escravista e a monocultura eram de cana-de-açúcar e café;
· Pós 1850: início das atividades industriais na Europa com mudanças para o Brasil, resultando em:
Ø Pressões da Inglaterra contra o tráfico de escravos;
Ø Pressões para regulamentação das propriedades rurais;
Ø Substituição da mão-de-obra escrava por imigrantes europeus;
· 1889: Proclama-se a República, mas a base latifundiária oligárquica continua a dominar a política e a economia nacional;
Ø A base oligárquica revolta os trabalhadores do campo que se organizam, a exemplo da revolta de Canudos;
Ø Os trabalhadores reivindicam “salários mais justos, melhores condições de alimentação e de trabalho” e se organizam em “grupos de cangaceiros no sertão nordestino” (RECH, 1994, p. 17).
· Século XX. O modelo fundiário em grandes latifúndios existentes desde a Coroa portuguesa, resultou a partir da segunda metade do século XX em organizações de movimentos sociais no campo lutando pela conquista de terras – reforma agrária. Analisando o exposto e confrontando com o pensamento de Caio Prado Júnior, podemos observar que,


O que muito estimulou a pequena propriedade foi a formação de grandes aglomerações urbanas e industriais. A produção de gêneros para o seu abastecimento (verduras, frutas, flores, aves e ovos) não era compatível com os padrões clássicos de grande propriedade extensiva e monocultural (PRADO JÚNIOR, 1987, p. 251).

O processo de colonização em várias partes do Brasil em pleno Brasil república, a exemplo do norte do Paraná na segunda metade do século XX, possibilitou a existência de pequenas e médias propriedades por um curto período de tempo. Seu desaparecimento nas três últimas décadas do século XX, entre outros fatores, foi devido a ausência de políticas públicas voltadas para o pequeno agricultor, proporcionando a concentração de terras em formato de latifúndios, com políticas voltadas ao agro-negócio e à agro-exportação.
No início da década de 1960, por exemplo, o acúmulo de vários problemas sociais no campo e a ausência de uma política governamental para resolver os problemas sociais e econômicos, empobreceu os camponeses e desencadeou um processo migratório interno sem procedência (com a migração de milhares de famílias nordestinas para os estados de São Paulo e Paraná, entre elas a deste apresentador, no ano de 1965). Destacamos que o país é eminentemente agrícola, constituído de pequenos agricultores, embora o processo de industrialização já fosse evidente no período.
O fim da década de 1950 e primeira metade da década de 1960 podem ser considerados precursores dos avanços relacionados com a questão agrária e com o surgimento dos movimentos sociais no campo, sob a influência de partidos e lideranças políticas que exigiam mudanças estruturais no campo, entre elas uma reforma agrária imediata. Entendiam que a reforma agrária amenizaria os problemas sociais e econômicos no campo.
Não imaginavam as lideranças sociais e políticas e nem os cidadãos que participavam dos movimentos sociais, que suas reivindicações no decorrer da década de 1960 e 1970, resultasse em perseguições, prisões, torturas e mortes com crueldades sobre estudantes, profissionais da educação, lideranças sindicais, políticas e religiosas, praticadas por militares brasileiros. As ações militares tiveram como resultado o surgimento na Arquidiocese de São Paulo, de Centros de Defesa de Direitos Humanos (CDDH) que, assemelhados aos que hoje existem, surgiram para defender os perseguidos e presos políticos pelo regime militar, ou seja, cidadãos com direitos políticos negados.
A Declaração Universal dos Direitos Humanos determina em seu “artigo V” que “ninguém pode ser submetido a tortura nem a tratamento ou castigo cruel, desumano ou degradante”, prevalecendo assim, de acordo com a Declaração, nos artigos I e VII, a liberdade e a igualdade em dignidade de direitos, sem qualquer distinção, assim como “proteção contra qualquer discriminação”.
Nesta linha de raciocínio, o que se faz hoje nos centros ou grupos de direitos humanos Brasil adentro, é defender o direito à vida, à educação, à saúde, ao emprego, à terra, à água potável, ao salvamento dos rios, lagos e mananciais. Além da defesa, os centros e grupos desenvolvem ações contra a tortura de todas as formas, independente do local e espaço onde aconteça: em casa, na rua ou nas prisões.
Visando a erradicação da violência em forma de tortura, apresentamos o resultado de denúncias de torturas feitas por meio do telefone 0800 “SOS Tortura” ao Sistema coordenado pelo Movimento Nacional de Direitos Humanos/Brasil (MNDH) entre os anos de 2001 e 2003. Dos 2.206 casos identificados no sistema como torturas, 1.366 ou seja 60,6%, foram caracterizados como tortura institucional, tendo as polícias militares e civis como protagonistas diretos ou indiretamente envolvidos; 222 casos, ou seja 10,1%, foram caracterizados como tortura privada e; 648 casos, ou seja, 29,4%, foram caracterizados como não torturas por não ter havido, por exemplo, testemunhas e ou provas que subsidiasse cada denúncia.
Em vista da Lei nº 9455/97 de 7 de abril de 1997, que define os crimes de tortura e dá outras providências discutiremos os casos caracterizados como tortura institucional, devido o Estado ser o principal violador dos direitos dos cidadãos. Dos 1.366 casos de torturas institucionais, destacamos que


O tipo de tortura mais recorrente é aquele que tem como finalidade obter uma confissão da vítima (Tortura-Prova) – 36,8% dos casos. Também é alta a incidência de práticas enquadradas como Tortura-Castigo (21,5%) e Tortura do Encarcerado (22,1%) [...]. Nota-se que, em alguns casos, o suposto desacato da vítima frente à autoridade policial dá ensejo às mais diversas e bárbaras agressões por parte dos agentes públicos. (MOVIMENTO NACIONAL DE DIREITOS HUMANOS – BRASIL, s/d, P. 36).

Destacamos ainda que das torturas institucionais, a maioria das vítimas


[...] são suspeitos de crimes, que vivem em condições sócio-econômicas precárias, com baixo nível de escolaridade e que, em geral, provém de grupos particularmente vulneráveis, cujos direitos têm sido tradicionalmente ignorados no País. (Ibidem).

Os agentes violadores agem na maioria das vezes sustentados na impunidade estrutural e judiciária e são na maioria, “policiais civis e militares”.
Dos 1.366 casos identificados de tortura, 829 ou seja, 62% foram praticados diretamente por policiais civis e militares e em 38% deles, policiais civis, militares e outros agentes do Estado estiveram envolvidos mesmo que indiretamente (funcionário de prisão, polícia federal, guarda municipal, funcionário público e ou polícia rodoviária) (Ibidem, pp. 37-38).
Destacamos que em 47,2% dos casos denunciados, as torturas foram praticadas em Delegacias de Polícias e em 26,9% foram praticadas em Unidades Prisionais.

Violência no campo

Voltando à nossa discussão sobre o campo, nossas observações e análises, sobre a “crise da agricultura” no início do século XXI – gostem ou não os produtores rurais – é conseqüência da “ganância” dos produtores rurais / latifundiários em acumular riquezas.
Devido à “ganância”, depreda-se a natureza por meio do uso desordenado de venenos, adubos e inseticidas; desmatam e atam fogo nas vegetações assoreando as nascentes, riachos, córregos e rios. O resultado da ganância e do uso desordenado do meio ambiente agride a terra, a água e as matas. Tamanhas agressões estão sentindo neste início de século XXI com a seca, queda da produção, doenças nas plantações e nos animais domesticados (febre aftosa e gripe aviária).
Tratando-se da violência, ela ocorre além da tortura física. É violência toda ação do homem por meio da agressão à natureza: rios, oceano e atmosfera, com prejuízos ecológicos irrecuperáveis em curto prazo. Dá-se ainda com as poluições industriais e por meio dos veículos de transporte, prejudicando a camada de ozônio, a sonorização e a áudio-visão dos homens e animais.
A violência à natureza se dá dos pequenos agricultores aos empresários do campo e, após cometê-las, atribuem a culpa da destruição e dos desastres ecológicos aos governos estaduais e federais.
A violência dá-se também sobre as pessoas de diferentes formas: tortura social, política, econômica e psicológica; em casa, no trabalho, no passeio, na igreja, na política ou na prisão.
A violência está caracterizada nos massacres que ocorrem sobre milhares de pessoas no campo e nas cidades; na criminalização dos movimentos sociais que lutam pela terra, moradia, emprego ou saúde e ou na destruição das políticas públicas voltadas às camadas vulneráveis da sociedade.
Conseqüências das diferentes formas de violências praticadas contras os cidadãos, o documento intitulado “Relatorias Nacionais em Direitos Humanos Econômicos, Sociais e Culturais” sobre “Alimentação, Água e Terra Rural, Educação, Meio Ambiente, Moradia Adequada e Terra Urbana, Saúde, Trabalho” da Plataforma Brasileira de Direitos Humanos Econômicos, Sociais e Culturais (Dhesc-Brasil) denuncia que,


Os processos de violação dos direitos incidem no dia-a-dia das relações sociais, promovendo exclusão e impedindo o acesso aos direitos. Manifestam-se de várias formas, desde o simples repúdio ou nojo contra o outro até formas de violência e apartação. (RELATORIAS NACIONAIS EM DIREITOS HUMANOS ECONÔMICOS, SOCIAIS E CULTURAIS, 2005, p. 143).

Para os relatores,


Negros, mulheres, indígenas e outras populações tradicionais, trabalhadores rurais e urbanos são os mais afetados pela violência e pela criminalidade, promovidas ou facilitadas pela ausência do Estado ou por ações das elites. (Ibidem, p. 144).

Destacamos ainda as identificações dos relatores do envolvimento direto das instituições e organismos públicos enquanto sujeitos da violência. Afirmam que


[...] instituições e organismos públicos são colocados a serviço de interesses privados ou se submetem a eles para viabilizar e legitimar esses processos. No limite dessa subordinação do interesse público aos privados, verificam-se formas ilegais e ilegítimas de funcionamento do Estado, configurando-se ele próprio sujeito ativo da violência e da discriminação – corrupção, criminalização dos movimentos sociais, utilização repressora abusiva do aparato policial. (Ibidem)

Acrescentemos à análise as violências praticadas contra a economia do povo por meio do desvio de verbas públicas; aumento desordenado de impostos municipais, estaduais e federais; perseguição política e ideológica; sonegação de impostos; compra de votos; manipulação da consciência social, política e religiosa, entre outras.
É importante destacar que ao tratarmos da violência, diretamente estamos tratando da violação dos direitos humanos a todas as áreas: educação, saúde, moradia, emprego, terra, meio ambiente ou seja, violação dos direitos sociais, políticos, econômicos e culturais. Destacamos ainda que o principal violador dos direitos humanos é o estado.
É no bojo deste contexto que após o final da década de 1970, com a crise do regime militar caminhando para seu fim na década seguinte, que ressurgem várias iniciativas de organizações sociais, entre elas o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra a partir de lutas isoladas – ocupações de terras, acampamentos e greves contra a construção de barragens das hidrelétricas – nos três Estados do Sul do Brasil e sua consolidação enquanto movimento no Congresso Nacional dos Trabalhadores Rurais, em Curitiba, em 1985 (sobre o assunto, ver documentos da Comissão Pastoral da Terra – www.cpt.org.br e documentos do MST – www.mst.org.br ou “História social: da invasão do Brasil ao maxixe e lambari”, Editora Massoni, deste autor e ou “Educação: campo e cidade – territórios do saber”, de Maria A. Cecílio e Elias C. Brandão, Editora Massoni).
De todas as violências ocorridas no campo e na cidade, as que mais aparecem são as voltadas contra os movimentos sociais no campo – sobretudo contra o MST – e as que tratam dos presos nas cidades.
Destacamos que estas não são as únicas violências ocorridas. Elas são as que os meios de comunicações sociais (MCS) dão maiores ênfases por serem as que proporcionam ibope, causam impactos e resultam em vendas de imagens – matérias – aos proprietários dos MCS. Visando lucros, as manchetes apresentam termos impactantes: “sem-terra invadem prédio do Incra”; “presos recebem visitas dos direitos humanos” ou, “direitos humanos defendem bandidos”.
As manchetes jornalísticas são apresentadas visando passar a idéia de que os direitos humanos se resumem a defender presos ou sem-terra, enquanto os direitos humanos são um conjunto de direitos – saúde, moradia, emprego, educação, cultura, lazer e meio ambiente, conforme se constata na Declaração Universal dos Direitos Humanos e nos documentos e pactos internacionais assinados pelos diferentes governos dos cinco continentes, comprometendo-se com a defesa dos direitos dos cidadãos.
Outra forma de violência que é praticada pelos governantes e pelos empresários do campo e da cidade, é o achatamento salarial ao não concederem reajustes aos trabalhadores. Nestes casos, a violência torna-se dupla.
Primeira violência ocorre ao não concederem um direito constitucional líquido e certo – o reajuste. O segundo ocorre por meio da violência direta sobre os trabalhadores ao exigirem o cumprimento de seus direitos, seja por meio da greve ou da pressão sindical. Neste caso, a violência tem ocorrido pelo uso da força policial – despejo e prisões políticas com abertura de inquérito e processos civis e criminais.
Devido as constantes ações de violências – na maioria das vezes praticada por policiais civis e militares – a população no geral não se sente segura e, com razão.
Os policiais, em si, ao invés de apresentarem segurança, causam medo à população. No caso dos policiais militares, em muitas cidades a farda, em si, amedronta os cidadãos e pouco se constata fazer para que tais sentimentos sejam revertidos. Os policiais parecem trabalhar com medo e por isso se apegam à farda e à arma para demonstrarem autoridade.
O medo e as violências continuam ocorrendo a cada instante em vários lugares do mundo e de diferentes formas: nas famílias, na rua, no trabalho e nas prisões.
Nos meses de julho e agosto de 2006, dois exemplos merecem destaques no Paraná.
O primeiro exemplo foi a greve dos servidores públicos municipais de Maringá/PR, com duração de 30 dias e que no decorrer dela, vários trabalhadores foram agredidos por seguranças da administração. Como resposta à ocupação do Paço Municipal, aproximadamente 250 policiais foram utilizados para realizar ação de reintegração de posse do Paço, que se realizou após as 00h00, momento em que por volta de 80 servidores se encontravam no local. Ação resultou na detenção de mais de 40 servidores, além da prisão do presidente e do advogado do sindicato dos servidores que também foram detidos, no caso do advogado, transportado algemado para a delegacia.
De acordo com o comandante da operação, a ordem a ele repassada ara a de que todos os que não saíssem livremente deveriam ser detidos, independente de resistência. Para o comandante, o fato de não saírem livremente caracterizou desobediência e por isso foram encaminhados à delegacia, violando violação os direitos humanos, vez que “ninguém pode ser arbitrariamente preso, detido ou exilado”, simplesmente quando a única “resistência” é ser transportada de um espaço para outro. Prescreve o artigo XI:


Ninguém pode ser condenado por atos ou omissões que, no momento em que forem cometidos, não tenham sido delituosos segundo o direito nacional ou internacional. Tampouco será imposta penalidade mais grave do que a aplicável no momento em que foi cometido o delito (DECLERAÇÃO UNIVERSAL DOS DIREITOS HUMANOS, Artigo XI).

A continuidade da violência ocorreu logo após a prisão quando, na delegacia, o delegado impediu, num primeiro momento, de os advogados e representantes dos direitos humanos de acompanharem os detidos que permaneceram ao relento enquanto foram ouvidos, sob forte frio, em pleno inverno.
O segundo exemplo, foi a onda de violência denunciada pela Comissão Pastoral da Terra do Paraná (CPT), contra sem terras.
De acordo com a CPT, entre 20 de julho e 01 de agosto de 2006, várias ações do governo do Paraná resultaram em um ferido, três presos, dois despejos e várias intimidações contra sem terra, a começar pelo município de Cruzeiro do Oeste, região Norte do Estado, resultando em ferimento, no dia 21 de julho, do “sem terra Almir Oliveira Rodrigues, surpreendido pelos tiros enquanto trabalhava na terra com outros companheiros” (http://www.cpt.org.br/?system=news&action=read&id=350&eid=126. “Nova onda de violência contra os sem terra no Paraná”). Outro episódio, ocorreu no dia “26.07.06, no município de Nova Tebas, região Centro-Oeste do Estado, onde cerca de 500 policiais militares despejaram as cerca 250 famílias que ocupavam a área desde o dia 07.07.06”. Nesta ação, três trabalhadores rurais foram presos e, no dia seguinte, as famílias reocuparam a área.
Por fim, no dia 01.08.06, no município de Paranapoema, cerca de 100 famílias acampadas foram pressionadas por cerca de 600 polícias militares a deixar a área. Todas as ações desde o início do governo Roberto Requião até o dia 1º de agosto de 2006, segundo dados da CPT num total de 99 ações, deixaram marcas de violência física e psicológica, haja vista que “foram presos 124 trabalhadores, 39 dos quais no ano de 2006”.
Para a CPT do Paraná, “a ação das milícias e da polícia tem deixado vários trabalhadores feridos: desde 2003 sofreram lesões corporais 54 trabalhadores”.
As situações identificadas nos indicam que de acordo com o artigo 1º, da Lei nº 9455/97, o Estado tem cometido crime de tortura ao:


I - constranger alguém com emprego de violência ou grave ameaça, causando-lhe sofrimento físico ou mental: a) com o fim de obter informação, declaração ou confissão da vítima ou de terceira pessoa; b) para provocar ação ou omissão de natureza criminosa; c) em razão de discriminação racial ou religiosa;
II - submeter alguém, sob sua guarda, poder ou autoridade, com emprego de violência ou grave ameaça, a intenso sofrimento físico ou mental, como forma de aplicar castigo pessoal ou medida de caráter preventivo. (PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA, Lei nº 9455/97).

As análises e estudos sobre a violência no campo e nas cidades e sobre a questão agrária no Brasil nos sinalizam que realizar investimentos sobre políticas públicas de retorno do homem ao campo e não apenas realizar programas ou projetos agrários paliativos que se acabam com o fim de cada governo, pode amenizar as questões sociais, econômicas, culturais e políticas no campo e nas cidades – violências urbanas e rurais – melhorando a vida dos que retornarem para o campo.
Políticas públicas nesta direção poderá garantir os pequenos agricultores no campo e poderá aumentar a produção, reativando o comércio, a indústria, a saúde, a educação e a cultura.


Referências bibliográficas

DECLARAÇÃO UNIVERSAL dos Direitos Humanos. Salvador: CESE – Coordenadoria Ecumênica de Serviço. 2003.
MOVIMENTO Nacional de Direitos Humanos – Brasil. Relatório final da campanha Nacional permanente de combate à tortura e à impunidade”. Brasília: s/d.
PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA – Casa Civil – Subchefia para Assuntos jurídicos. Lei nº 9.455, de 7 de abril de 1997 – Define os crimes de tortura e dá outras providências. http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L9455.htm
RECH, Luiz Roberto Dalpiaz. A verdadeira política da terra. Porto Alegre: Imprensa Livre, 1994.
RELATORIAS Nacionais em Direitos Humanos Econômicos, Sociais e culturais. Maria Elena Rodrigues (org). Rio de Janeiro, 2005.
RELATÓRIO da Rede Socil de Justiça e Direitos humanos em colaboração com Global Exchange. Direitos Humanos no Brasil 2003. Evanize Sydow e Maria Luiza Mendonça (org.). São Paulo: s/edit., s/d.

2 comentários:

  1. muito legal gostei muito desse site explik muitas coisas
    iradoooooooooooo!!!!!

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  2. Gostei me ajudou muito

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